Liberdade e solidão

Uma amiga, outro dia, escreveu sobre a liberdade e eu fiquei matutando sobre o assunto. Ô assuntinho delicado, que serve, isso sim, pra deixar a gente meio triste, com vontade de não ser tão livre assim.

Liberdade não tem relação alguma com essa foto linda ao lado. Liberdade é troço sofrido, adquirido com esforço e solidão, caro à beça. Liberdade só vira coisa boa quando pode ser compartilhada com alguém que sabe exatamente aquilo que enfrentamos para conquistá-la.

Mas, sinceramente? Eu fico me perguntando por que é que a gente tem tanta vontade assim de ser livre. Não seria uma fantasia achar que liberdade e felicidade andam juntas? Não andam, não!

Aliás, felicidade não anda de braços dados com nada, a não ser com o instante em que ela acontece. Felicidade não é estado de espírito, não é uma tábua onde a gente se deita e desfila mar a fora, sorrindo para o mundo. Felicidade perene só permanece na esperança, pois sem ela, esperança, ninguém é feliz ou tem a perspectiva de ser.

Já reparou que, quando se perde a esperança, nada mais resiste? Pois, então, não seria mais justo enobrecer e elevar e buscar a esperança, ao invés da felicidade?

Voltando à liberdade, a única que eu quero cultivar e manter é a liberdade do espírito, do sentimento, porque, no resto, ela não tem sido muito útil, não. Hoje, eu posso voar mais alto, mas e a segurança de ter chão na volta? Se eu quiser chão, eu que o construa antes do vôo, porque, depois, neguinha, bau-bau: sou eu comigo mesma, é comigo que eu tenho que resolver; se não tiver chão, haja perna na aterrissagem.

Falo isso sem mágoa, apenas constatando o que todos os filósofos trataram de escrever, na tentativa de alertar os românticos como eu: pega leve na busca, liberdade demais é solidão na certa. Se bem que, livre ou não, todo ser humano é só na sua dor mais profunda e no seu prazer mais incrível. A diferença é que, sem liberdade, a gente desconhece o que incomoda. E não sabe que nunca ninguém sentirá o que nós sentimos, e que é isso o que faz de nós seres tão singulares, pra usar uma palavra mais simpática.

A única liberdade feliz, que libera a esperança e sorri para os dias é a liberdade do destino. Eu sei que cito Nietzsche demais, mas fiquem com esse trecho e me digam se ele não merece mesmo todas as citações:

E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: ‘Esta vida, assim como tu a vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes; e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indizivelmente pequeno e de grande em tua vida há de retornar, e tudo na mesma ordem e sequência’ - [...] Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasse assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal em que lhe responderias: ‘Tu és um deus, e nunca ouvi nada mais divino!’” (Friedrich Nietzsche, A gaia ciência)

Comentários

Anônimo disse…
moça, vc está certa, é preciso abrir mão de um pouco de liberdade para conquistar certas coisas, e vice-versa, vc melhor do que ninguém sabe disso.
não esqueça que tem sarau nesse fim de semana, já está tudo pronto.

bjão
Unknown disse…
Muito bom! Eu não consegui escrever bem sobre o assunto. Ainda vou voltar a ele. Este tema merece versão 2, 3 , 4 e muitas outras. Obrigada pelo texto.
BOm demais ler ...

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