O valor inestimável da continuidade
Abrir os olhos requer coragem, despreendimento, amor acima de tudo. Outro dia, comentei com amigos que eu precisava enxergar como buda. De alguma forma, de uma maneira invísivel, uma mudança acontecia e eu queria olhos (aqueles da alma) para percebê-la.
Foi um desejo tão profundo aquele meu, quase desesperado, que, horas depois, meus olhos enxergaram desarmadamente. É o desejo, profundo e certo da vida, que transforma. Nada mais. Não existe dor, nem castigo que resolva. É preciso desejar verdadeiramente.
Só que a coisa não pára por aí. A gente só sabe que amadurece quando entende que uma conquista não significa descanso. Significa mais. Mais atenção, mais cuidado, mais esforço para não cair nas armadilhas anteriores. Não que isso seja dificultoso ou sofrido. Ainda porque, mesmo sem esse "trabalho", vida alguma seria fácil.
Mas, falando nas armadilhas, acredito que depois de muito treino, elas enfraqueçam um bocado. Acho que a palavra certa nem é essa - armadilha. Parece mais com vício, daqueles culturais, sociais, criados como gotinhas pingando na cabeça da gente. Tem os outros vícios mais marcantes, aqueles advindos das experiências, muitas vezes nem nossas, mas refletidas em nós. Todo dia eu tento me desviciar um pouco para não contaminar ninguém.
Pois, então, eu continuo dizendo: um pedaço visto ou resolvido não é garantia de acertar 100%. É só um pedaço! Isso não quer dizer que não tenha sua importância. Sem esse pedaço, nada além dele pode ser conquistado. Ele é parte do caminho, é o primeiro minuto da hora inteira, aquela respiração que, seguida da outra, garante nossa vida por anos.
Falar, conversar, principalmente para alguém como eu, é uma vitória danada. Mas, fundamentalmente, as respostas mais importantes chegam sem palavra alguma, com a observação dos gestos, com a entrega (assunto para anos). Isso, entretanto, não quer dizer que há alguma coisa definitiva, sejam gestos ou palavras. Só a continuidade valida a verdade. É, de fato, o dia depois do outro que comprova nossos discursos e intenções. Se nós mudamos, todo o resto nos acompanha. Donde se conclui duas coisas: certas mudanças são lentas (porque mudamos lentamente) e toda mudança é possível, quando desejada.
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